CASAL DO FOZ A TERCEIRA LENDA

Sem duvida, o Brasil é o País do futuro. Há apenas, de não se adiar esse futuro.

sexta-feira, 30 de abril de 2010

AMOR NA GUERRA

DESASTRE EVITA ATAQUE

Como ainda se estava em tempo de tempestades tropicais, assistiu-se a várias, era a África!...
Onofre não podia deixar de observar também esse aspecto, de que guardou recordações.
A nove de Novembro 1962, pôde ficar anotada uma dessas memórias do tempo.
Na pista de aterragem do Tari, onde se estava de guarda a uma avioneta ali estacionada, havendo um calor desmedido.
Face ao mesmo foi erguida uma tenda, para protecção dos raios solares.
A mesma veio a servir de abrigo de uma chuvada extremamente intensa de seguida.
Era assim o clima tropical daquela parte de África!....
Tinha-se iniciado a cobertura defensiva da citada avioneta, que no caso de emergência serviria de apoio a um grupo de pára-quedistas em actuação de "limpeza" na zona.
Os soldados aproveitavam a avioneta  para sevir de fundo as suas fotos

A operação durou até dia catorze, naturalmente com várias rendições da guarda.
Depois de passada a tempestade tropical, o tempo e o serviço até se tornavam agradáveis, mesmo o dormir ao luar, fora dos necessários tempos de alerta, que cada um tinha de cumprir.
Até que, precisamente nessa tarde, se ouviu uma grande explosão, logo pareceu na cozinha do aquartelamento do Tari.
Pensou-se em muitas hipóteses, mas foi numa das casernas, pois não tardou a resposta, visto que se estava apenas a três quilómetros.
Começaram de imediato a chegar feridos em transportes terrestres, do ar avionetas e helicópteros, para os transportar Hospital Militar de Luanda.
Todo o contingente de serviço na pista, actuou a ajudar na instalação nos veículos aéreos, acarinhando os camaradas feridos, a evacuar, para breve serem ser assistidos em Luanda.
O lance causou elevado constrangimento, marcado também por um dos helicópteros transportar dois feridos na parte de fora, numa espécie de caixas, dando a ideia de se tratar de caixões fúnebres.
Do acidente, resultaram duas baixas e oito feridos.
Resultou grande destruição, como por exemplo, um soldado tendo o fardamento guardado no seu saco de campanha, este ficou reduzido ao metal que servia de fecho.
Na sala de oficias, com uma parede a dividir, um oficial que descansava foi atingido com gases na cara, ficando esta chamuscada.
Aconteceu que, talvez por descuido:
- Tendo regressado um pelotão de uma batida, como era usual a Bazooca ficou ligada, com a respectiva granada. Alguém brincou com a arma e deu-se a explosão.
Alguém, desconhecendo o facto, terá "brincado" com a mesma, provocando o seu rebentamento.
Em termos operacionais, não se pode saber, o que teria ter acontecido de pior: se o grave acidente bélico, se o ataque terrorista previsto à tropa em vigilância, pois de seguida ao rebentamento, ouviu-se o característico alerta, denunciando por uma batucada.
Era o sinal do adversário para o abortamento do ataque terrorista que estava em movimento.
Os guerrilheiros da UPA também ouviram o estrondo, pensando terem sido descobertos, alertavam para a abortarem com a consequente retirada.
A operação terrorista, se levada a cabo teria sido desastrosa, uma vez que o contingente, em serviço ao campo de aterragem, se encontrava muito descontraído e o factor surpresa é importante em todas as guerras!
Uns jogavam as cartas, outros comentavam sobre as performances de mulheres das suas Madrinhas de Guerra, mostrando as respectivas fotos.
Ainda outros, do tempo que ainda faltava para irem ao encontro das namoradas.
Dos seus projectos a dois, etc.

Daniel Costa

quarta-feira, 28 de abril de 2010

AMOR NA GUERRA


A COMUNICAÇÃO SOCIAL

Abordar o conflito que as tropas portuguesas começaram a enfrentar em Angola, logo em 1961, sem mencionar o quanto foi retrógrada a comunicação social, cuja atenção foi desviada propositadamente, da missão que lhe cabia na circunstância, pelos poderes instalados é de primordial importância.
Em 1962 a Televisão, dava passos de apenas cinco anos, pelo que não se vê algo de televisionado, a informação limitava-se à oficial, do princípio do conflito (da maka, no dizer local).
Numa plantação de ananazes

As rádios ainda estavam longe de manter sinal aberto, durante vinte e quatro horas. Apenas a Emissora Nacional tinha o seu correspondente, que não ultrapassaria o perímetro de Luanda e os grandes jornais, pela limitação censória, só observariam de Lisboa o que se passava no Ultramar.
É interessante verificar o facto, de só mais tarde a Radiotelevisão Portuguesa gravar e transmitir, pelo Natal, aqueles insípidos programas em que os elementos militares em fila, ditavam algumas palavras, impostas pela censura para familiares e amigos.
A mesma transmissão começou por ser cometida à Emissora Nacional, que os difundia logo em 1962, numa altura em que o próprio Onofre disse não, à oportunidade proporcionada a partir da região dos Dembos.
Com a grande distância temporal poder-se-á questionar, mesmo tendo em conta a política da época, o quanto uma maior divulgação seria importante.
A célebre frase de Salazar – “para Angola e em força”, perdia-se assim nos meandros da sinistra comissão de censura.
Só de uma política passadista!...
Ao elaborar este trabalho, há talvez o interesse no ineditismo de se basear apenas no testemunho vivencial de uma praça, porquanto o tema tem tido muitas abordagens, ao que se pode saber, a maior parte por escritores que ali serviram como oficiais, com interesses pessoais interrompidos, o que torna as visões extremamente diferenciadas e até antagónicas.
Ouvindo um dos os dos rarios rários e confraternizado

Acrescenta-se para apoiar a tese desta grande falha, o facto de ainda por volta de 1967, época contemporânea, ter tombado no conflito do Vietname um Repórter de Guerra português, ao serviço do jornal "Diário Popular", de apelido Câmara Leme.
Nos documentos da guerrilha, que a Televisão vem passando, mesmo sendo posteriores aos primeiros anos, não se conseguirá ver algum episódio a que não se possa atribuir o rótulo de encenação, ou propaganda política, como no caso da retoma de Nambuagongo.
Entre os muitos sucessos, algo de grave ocorreu no aquartelamento do Esquadrão. O Comandante estava ausente, em gozo de férias na metrópole.
Interinamente fora substituído pelo tenente Araújo, não teria sido acaso a ausência do Capitão, porque se sabia o rigor da sua actuação em qualquer circunstância, nos actos da sua competência. Num determinado dia ao jantar, aconteceu o que ficou demonstrado, ser de verdadeiro levantamento de rancho.
Ninguém tinha vontade de comer!...
A alegação geral, para a inibição de se entregarem à degustação daquele jantar, era a de se ter ingerido algo mais apetecível antes.
Pareceria estranho, se não tivesse chegado o aviso a todos os militares, até com a cumplicidade dos cozinheiros.
O posto de Oficial de Dia, obrigatoriamente comum em todas as unidades, dispensava essa ordem de serviço, em cenário de alerta permanente, que a circunstância revelou ser o alferes Faria a deter o cargo, naquela jornada.
O Onofre, mesmo estando de serviço de vigilância no torreão, com a sua observação, apenas detectou um militar a "fingir" que comia, naturalmente de mentalidade mais fraca, instado pelo Oficial de Dia, a provar o rancho destinado para aquela refeição.
Tanto bastou para o levantamento não ter sido considerado, o que traria consequências disciplinares ao mais alto nível.
No dia seguinte, mesmo na interinidade, o Comandante do Esquadrão deslocou-se a Muxaluando, local onde estava a logística do Batalhão, para apresentar os factos ao Comandante da expedição.
Verificou-se assim, que tinha ocorrido algo de muito grave, originando uma formatura onde foi dado conta das providências levadas a efeito, para que tão relevante ocorrência ficasse sanada.
Ficou registada uma frase proferida pelo tenente Araújo de certo modo humanística.
Foi dito assim: "O que se faz nem tudo é por mal"!
Terá sido usado também ao conferenciar com o Comandante.
O pensamento pode parecer vulgar, mas pronunciado na altura e a culminar um caso de reivindicação justa, embora de muita gravidade no seio forense, revelava mesmo um grande sentido de humanidade.
Houve depois retaliações!
A seu tempo regressado o Capitão Alves Ribeiro, pretendeu fazer justiça, atribuindo algumas sanções com a respectiva expulsão.
No caso específico, a coerência, só podia determinar um culpado, o exclusivo alvo da contestação, o furriel especializado na manutenção alimentar.
De qualquer modo, ficou demonstrado, se isso fosse necessário, que a grande coesão do 297 era obra de um comando eficaz.
A acção reivindicativa, um alienável direito, estava em causa uma alimentação condigna, o que não acontecia.
Deve admitir-se, que o território de Angola exercia uma grande atracção, não obstante estar-se a viver uma guerrilha, num obrigatório isolamento, só superado por ser exercido em grupo e pelas actividade lúdicas, que iam nascendo da criatividade inerente à juventude, como o eram por exemplo os torneios de futebol, entre pelotões, jogados num campo, construído fora do recinto delimitado por arame farpado.
Viviam-se os jogos a sério, visto fazer parte do Esquadrão muito material de desporto, como bolas e equipamentos.
Era possível realizar grandes partidas, até porque havia jogadores de certa grandeza.
Normalmente, os militares disponíveis sempre assistiam. Em virtude do recinto desportivo ser exterior ao acampamento, os assistentes levavam, obrigatoriamente do seu armamento, em guerra podia ser fatal descurar o aspecto bélico!...
E para os que não viveram no tempo, fica aqui referido o facto de um esquadrão de cavalaria ou outra qualquer companhia em campanha, completar-se com inúmeras actividades de entretenimento, com especialistas na área, na vida civil.
Assim foi exibido no Tari, dedicado aos militares, evidentemente, o filme português "O Grande Elias", serão inesquecível na circunstância!...
Três tiradas fizeram o divertimento da malta:
- Uma em que, num jogo da roleta, o Elias aconselhou o parceiro a jogar no dezassete. Claro que ao invés de ganhar o dinheiro de que necessitava, ficou ainda mais na penúria, porém o Elias nunca o desencorajava e numa outra cena, vê-se ele a dizer ao acompanhante:
- "Pois é...como sair no dezassete"!...
A última é quando o Elias, a servir de mordomo, conquista o coração da velha tia rica e segue com ela para a América, dirigindo-se ao avião; com ar bonacheirão volta-se e diz:
- "Agora vai ser milho"!...
Estas expressões foram adaptadas por muitos e bons rapazes, durante muito tempo, que à falta de melhor, de tudo se serviam.

Daniel Costa

sexta-feira, 23 de abril de 2010

AMOR NA GUERRA

ÍCONES DA GUERRA

No dia vinte e três de Outubro, havia intranquilidade no comando do Batalhão, sito em Muxaluando, uma coluna militar a rodar para aquela posição foi atacada, sofrendo duas baixas mortais, mais alguns feridos.
Era um dia de muita chuva, vários acampamentos da região estavam também a ser atacados, todo o pelotão a que Onofre pertencia, estava de prevenção face ao conflito, tendo depois seguido em missão de auxílio.
Chegado o reforço, foi-lhe destinada uma ida a Nambuangongo, com o fim de se trazer sob escolta, um carro pronto-socorro, para se recolherem as viaturas sinistradas no ataque, que destruiu a sua autonomia de locomoção.
Não havia viatura do género disponível, pelo que,sempre pronta a entrar em acção, a coluna voltou como tinha seguido e ficava na sede do Batalhão alerta para actuar, se fosse necessário.
Banho, não sem humor, nas fragas dio rio Luaca, a cerca de trinta Km
a sul de Nanbuangongo

Como entretanto tinham seguido outros reforços disponíveis, os mesmos ao voltarem foram surpreendidos com o rebentamento duma mina anti-carro, a primeira com que o Batalhão se deparou, talvez uma daquelas que deu início a novo tipo de guerrilha.
Resultaram vários feridos, entre os mesmos, um Alferes que ficou com as pernas praticamente decepadas. Veio a ser baixa mortal, já verificada no posto de socorros de Muxaluando.
No mesmo dia a aviação interveio, o serviu apenas para verificar terem ficado no terreno mais algumas viaturas destruídas.
Depois de um período mais calmo na actividade terrorista, tinha começado uma nova fase da guerrilha e por causa das minas anti-carro os oficiais deixaram de andar na frente nos Jeeps pessoais, para andarem nos Unimogs, fazendo parte integrante do pessoal que estes transportavam.
Na dianteira de cada coluna, passou a seguir uma camioneta GMC, extremamente pesada e com uma frente grande a qual podia provocar o rebentamento sem afectar o próprio condutor.
Aquele monstro passou a andar com a caixa cheia de sacos de areia, afim de se tornar ainda mais pesado e por isso menos vulnerável.
As GMC e outros veículos, que dotavam todas as companhias militares, eram resíduos da motorização que tinha servido a Segunda Grande Guerra e que depois vieram para Portugal.
O grande conflito tinha chegado ao fim em 1945, em 1962 havia ainda poucos anos. Afinal todos os militares tinham nascido ainda no tempo em que o maior conflito bélico do mundo grassava.
Ao passar a noite de sete, precisamente à uma hora calhou de novo a Onofre e companhia, com outras unidades, integrar uma escolta.
Uma metralhora Breda e a respectiva equipa montados
em jeep blindado

Por alguns dias, a força de cobertura da deslocação a proceder a uma importante operação, esteve aquartelado na Fazenda Três-Marias.
A dormida era conjunta com os colonos, que se encarregavam de zelar nos trabalhos a efectuar por indígenas de raça bailunda, por mais fácil adaptação..
A trinta e um foi a guarnição ao encontro da tropa em operação, na picada próxima, com passagem pelos destroços das viaturas, momentaneamente abandonadas, recolhendo e transportando alguns de imediato.
A seguir, logo a um de Novembro, houve mais uma espécie de destacamento para Muxaluando de um grupo do pelotão a que Onofre pertencia. A missão era a da equipa da Breda escoltar o grupo de militares do esquadrão do comando, escalados para transportar o resto dos destroços das viaturas, deixadas no terreno, após o duro golpe sofrido na picada havia poucos dias. O que veio a acontecer.
Depois de realizada a operação, Onofre, Esquim Pinto, Teodoro e Gastão, com todo o equipamento, ficaram três dias junto do Batalhão, o que depois dos acontecimentos, emprestava maior segurança, já que aquele aquartelamento não estava munido de equipas de metralhadoras pesadas, ao contrário dos restantes três esquadrões.
Em Muxaluando ouvia-se comentar, seriam aquelas armas pesadas, que os terroristas apelidavam de costureirinhas, pela rapidez e poder de fogo que realmente possuíam, a reforçar a segurança.
No breve destacamento, para um observador e com espírito aventureiro, tudo servia de reflexão.
Então um dia assistiu-se a um daqueles desafios de futebol, não tão improvisado, como poderia parecer, porque era vulgar em qualquer acampamento militar.
Observou-se um dos guarda-redes ser o segundo comandante da força, o Major Caldeira, já de certa idade.
Pelo elevado posto e pela própria idade, não lhe seria apropriada a dedicação à ao tipo de exercício, mesmo usado uma camisola regulamentar, por ser um pouco forte para poder vestir a camisola do próprio equipamento desportivo.
Era do conhecimento geral, o homem padecer da "bola", tanto mais que era um bom motivo para conversas anedóticas, entre os seus comandados.
Já era então conhecido pela alcunha do "pai da Cuca", pela dedicação à bebida alcoólica, mais usada na Colónia de Angola.
Diga-se que nas cantinas da tropa, o seu custo ficava em metade, o que se tornava mais um aliciante.
No dia quatro deu-se o regresso ao Tari, não sendo novidade absoluta, na parede de uma das casernas, a primitiva que continuava a funcionar, só com um pelotão, ver-se incrustada uma imagem da Senhora de Fátima.
O ícone, uma espécie de troféu apreendido numa batida, teria sido arrancando pelos terroristas em alguma fazenda abandonada, depois de atacada.
O Comandante Alves Ribeiro achou por bem mandar colocá-la num nicho, bem visível, na parede do grande edifício, que apesar de sido arranjado, nomeadamente na cobertura, depois de vandalizado pela guerrilha, que permaneceu com a pedra da parede à vista.

Daniel Costa

segunda-feira, 19 de abril de 2010

AMOR NA GUERRA

NO DIA DO SANTO DE ASSIS


A menção do Santo tem várias razões, se outras não existissem. Foi nesse dia quatro de Outubro, que do pelotão, apenas não foram acordados os elementos da esquadra da Breda, de que Onofre era parte.
Todos os Batalhões estacionados em Angola tinham o seu padre capelão, tal como o 350 usufruía de serviço religioso, a cargo de um eclesiástico graduado em Alferes, que era componente, ia percorrendo todas as bases, rezando missas dominicais, aquando passava em cada sede de Esquadrão.
Aconteceu diversas vezes na posição do 297.
Confrternização com umas "cucas"
o militar do centro está com um quico na cobertura  da cabeça

Naquela zona de mato, só se conhecida a capela de Nambuangongo, o clérigo que pertencia e acompanhava espiritualmente este Batalhão de Cavalaria, estava equipado com um altar portátil, tipo mala de viagem, para a concretização dessas funções.
Ainda em 1962 o comandante do Esquadrão, Capitão Alves Ribeiro, que ia dando mostras, em todas as circunstâncias do seu real valor militar, como comandante de operações.
A sua capacidade organizacional e estética manifestava-se:
- Com as matérias-primas vindas de Quimanoche, transformara por inteiro o complexo operacional do Tari, provendo-o duma caserna para cada pelotão, o que tornava muito mais prática a reunião, sempre de madrugada porque, o sigilo das acções a efectuar assim o exigia.
Chegava mais uma G.M.C. carregada e em geito de festa

Só naquela hora, ao serem acordados os respectivos elementos, o segredo era um pouco revelado, sem ter de se passar a outros canais.
Além de melhores condições de operacionalidade, contava-se com a colaboração do indígena Lopes Cabanda, como guia eficaz, em virtude de conhecer o terreno, factor que em muito aumentavam a eficácia do Esquadrão.
Chegado a dia quatro de Outubro, que o capelão saberia de cor, ser o de S. Francisco de Assis, não só pela importância, mas também porque todos os calendários litúrgicos o mencionam.
No dia da celebração do famoso Santo, na caserna onde se encontrava instalado o pelotão de Onofre, a madrugada esteve muito agitada, alertavam-se todos os elementos, menos os que fariam funcionar a Breda.
O dia do Santo que nascera em Assis, Itália, no seio de riqueza e ali havia feito votos de pobreza, a que se dedicou até à morte, acabaria por ser o mais promissor da existência do Esquadrão.
Posto de socorros do Esquadrão
O movimento madrugador, na caserna, acabou de por ser frutuoso. Destinou-se a efectuar uma batida onde foram eliminados vários terroristas, enquanto se contavam em número de dezanove os forçados a entregarem-se, escolhendo a sobrevivência.
Aconteceu um outro facto, menos dignificante:
Desse grupo fazia parte uma “trabalhadora” do sexo, eventualmente, em cuja laboração se empenhou parte da noite. Naturalmente, com a passividade oficial, que terá ao mesmo tempo estipulado o custo de cada uma das muitas "bandeiradas”.
No mesmo mês de Outubro, precisamente no dia dez, numa batida efectuada por outro pelotão de serviço, resultou o aprisionamento de mais dois elementos afectos ao terrorismo.
Depois das novas instalações, passou ao Tari uma companhia em, deslocação. Em casos destes, o comandante da força em movimento, conferenciava com o homólogo local.
Todas as conferências, nestas paragens de intervenção eram, necessariamente demoradas, desta movimentação resultou todos os elementos jantarem localmente.
Findo o repasto, com o objectivo sofisma de bem receber os visitantes, numa das novas casernas começaram os dois acordeonistas do Esquadrão a actuar. Tinha sido criado a configuração de um arraial em terras de província.
Em breve, a luz com um apagão como por encanto, deixou de funcionar e os quicos que cobriam as cabeças dos militares em trânsito, como que por encanto, numa razia concertada voaram todos.
«Foi a mais ousada subtracção daquela peça de vestimenta, tornada em estima para muitos, por servir de entretenimento para os rapazes do Tari, o “roubo dos quicos”.



Daniel Costa






sábado, 17 de abril de 2010

AMOR NA GUERRA

DISCOS PEDIDOS

É tempo de expressar-se, desde já que as mortes infligidas a terroristas na mata, ficavam à conta dos seus camaradas. Obviamente o transporte feito pelas tropas regulares era impossível.
Deve ficar esclarecido, no Esquadrão, era ponto assente que só se recorria à força de tiroteio, depois de dada ordem para os opositores se entregarem.
Aquela guerra visava apenas a integração. Passada a fase da grande violência terrorista, a força de retaliação queria evitar represálias.
Estas eram as ordens emanadas dos comandos e eram respeitadas escrupulosamente no Esquadrão 297.
Música improviada na guerra

Por esta altura tornava-se muito frequente as idas a Quimanoche.
Enquanto se recuperava material de construção, não deixava de estar em acção um objectivo principal, a vigilância do perímetro adstrito àquela força expedicionária.
No âmbito desse desiderato havia já um pelotão do grande quartel da cidade de Nova Lisboa, constituído por militares locais em que só o superior, um alferes, um sargento e dois cabos eram brancos.
Estavam na Fazenda Três-Marias, a base para em muitos regressos, se efectivarem os almoços da tropa em movimento.
Sempre no âmbito da operacionalidade, coube ao Onofre e companheiros, participarem em mais uma escolta, onde se contou a apreensão de valiosos documentos e variados objectos.
A dez de Agosto houve novo destacamento de substituição em Vista Alegre. Além da continuidade em posição operacional, foi retomado o que já se tornara rotineiro:
- Posição adaptada à espera de entrar em combates de guerra!...
Em vinte e quatro de Agosto, numa viagem ao Tari tomou-se conhecimento que, numa operação um dos pelotões havia aprisionado duas mulheres.
Agosto de 1962, dia vinte e nove, a tropa do Esquadrão numa acção de assalto, a que se ia dando a denominação de batida, fez várias baixas e apanhou um casal, cuja condição de terrorista não seria adequada.

Ângela Maria, cançonetista brasileira com os seus grandes êxitos na rádio
O maior seria: "Será que eu sou feia? / Não é nao senhor / Você é um amor"

Enquanto permaneceu no Tari, não foi muito molestado nos normais e habituais interrogatórios nestes casos.
No dia doze de Setembro, foi a vez do Onofre, em substituição alinhar apeado numa batida.
Pela única vez, andou cerca de oito horas embrenhado na mata e no capim. Deu para entender melhor o grande esforço desenvolvido pelo Esquadrão.
Nada tendo resultado, serviu apenas para ver um terrorista de longe em fuga desordenada fora do alcance de trajectórias balísticas, com o armamento disponível ou com perseguição naquele terreno de vegetação tão exuberante, sempre mais favorável a fugitivos conhecedores do meio.
No dia dezassete, ainda no mês de Setembro de 1962, de novo formado pelo pelotão do Onofre, com a metralhadora pesada Breda, montada no Jeep que este comandava, partiu às duas da madrugada para entrar em nova batida, onde foram efectuados mais mortos.
Recorda-se aqui o vinte e sete de Setembro, em que numa missão das habituais escoltas, desta vez a Mucondo, no caminho foi avistado e caçado um javali:
Foi necessário todo um pelotão, o efectivo da tropa em movimento, para efectuar a caça à peça, que depois serviu uma refeição.
Verificou-se difícil haver numa mesa de carne tão saborosa.
No seio de uma guerrilha, como a que se verificava, se vista com espírito de aventura, à maneira do Onofre, podem encontrar-se momentos de agradabilidade.
Numa altura em que se ia desenvolvendo imensa luta, com o inerente trabalho, para que se reconhecesse predominar ali o Grande Esquadrão.
Em virtude da amizade muito pessoal e próxima que o Onofre mantinha com o Jaime, um dos poucos a possuir um rádio portátil a operar naquele acampamento, algures numa mata a Norte, em quartel militar, a audição do receptor era um dos entretenimentos disponíveis.
Como os inúmeros postos emissores difundiam para os muitos contingentes militares que ocupavam a zona envolvida pela guerrilha, todos tinham já na grelha de programas, vários de discos pedidos, muitos dos quais chegavam de familiares, amigos e Madrinhas de Guerra, vindas do Continente.
Nomes em voga muito passados nessa altura, além de outros eram os de António Prieto (latino-americano), Paul Anka (Canadiano), Frank Sinatra (americano), Gelu (espanhola), Ângela Maria (brasileira), Fernando Farinha, "Os Planetas da Kaala" (grupo de militares aprestar serviço em Angola), "Conjunto Maria Albertina" ou Raúl Solnado (mormente com a "História da Ida à Guerra").

Gelú, cançonetista espanhola. As rádios difundiam várias vezes por dia
em discos podidos por família, namoradas ou por essas grandes figuras,
as Madrinhas de Guerra, o seu êxito "Moendo Café"

As Madrinhas de Guerra constituíam também um paliativo para ajudar na passagem daqueles tempos. Portanto a chegada da avioneta à pista do aquartelamento era muito saudada.
Sempre aguardada por um pelotão em pronta posição de defesa.
De recordar, uma aventura de Onofre; ideia do Arlindo, sempre ele:
- Passou a enviar as cartas para algumas Madrinhas de Guerra, sem o respectivo selo da taxa, dizia ele: que paguem a multa, para alguma coisa servem. Devem pagar, para ajudar o Estado, no esforço da guerra!
O inefável Arlindo dizia isto, com o ar mais sério deste mundo.
Estava-se na fazenda Vista Alegre, passou uma coluna, vinda do Tari, que foi em serviço a Muxaluando, onde estava sedeado o Batalhão e era possível adquirir selos, assim como passava a avioneta em maior número de vezes.
A correspondência sempre em dia era um modo
de empregar tempos livres
Comandava a coluna o Sargento Pires que levou o correio, algum para selar. Porém uma carta enviada por Onofre ali estava, como que selada.
Propositadamente, o sítio do selo estava arranjado como se este tivesse caído. O Sargento adquiriu a estampilha e remediou.
No regresso contou o sucedido e obteve sorrisos como resposta.
Soube então que os três da vida airada, Daniel, Teodoro e Arlindo, tinham adoptado o sistema, toda a gente voltou a sorrir.
Depois, houve mais risos: Onofre quis pagar os 2$50, custo do porte da carta, porém o Sargento encolheu os ombros, voltou a sorrir e não quis aceitar.
Não se pensava tanto na carne, peixe e outros frescos que deveria transportar bissemanalmente, destinados à alimentação, mas no correio que também chegava por aquela via.
A correspondência que exercia fascínio, enquanto levantava o moral das tropas.
Onofre parecia viver obcecado por aquela que sempre adocicou a sua existência por toda a comissão, marcando constante presença com as suas missivas.
Era a Ana Zé, que mantendo a sua obsessão, hesitou em subir de "posto", como se diria em conversas de caserna, encontrando sempre uma bondade incomensurável da parte do Onofre!...

Daniel Costa

terça-feira, 13 de abril de 2010

AMOR NA GUERRA

A MAGIA DO RIO LIFUNE

O Rio Lifune está implantado na região onde principiou a rebelião da grande Colónia de Angola, uma das que Portugal ia administrando em África, destinada a subverter a situação que os naturais, assim como a opinião pública mundial consideravam injusta.
Na antiga Região dos Dembos, banhada pelo Lifune, onde o Onofre se movimentava, vivendo uma aventura, que não era mais do que o grande desejo de liberdade, de conhecer novos horizontes, em resumoa mobilização para a guerra estava ali a conferir-lhe a grande oportunidade desejada.
Assim aquele Rio era a magia com que convivia diariamente, sustentava a ponte de alvenaria por onde tinha passado toda a estrutura militar, que retomara à ainda rudimentar organização da UPA, a "fortaleza" que esta fizera da célebre povoação de Nambuangongo.
Penhasco sob a ponte do rio Lifune
Não sem antes os terroristas terem tentado destruí-la, com o sentido de cortar o avanço à coluna militar que por aí se deslocava.
Por a posição da tropa no terreno, no encaminhamento do objectivo não o permitir, só foram destruídas a maior parte das guardas laterais, bem como alguns locais onde estavam colocados os pilares dessa.
Dois solados posam junto a um carro destruído,
os pneus aproveitados para improsisar cançado

O rio Lifune percorria a calma região entre a Fazenda Tari, que assim ganhara o prefixo do Rio e a Fazenda que ostentava a designação da mesma corrente aquífera, de seu nome próprio Lifune, tudo por uma questão de proximidade e referência.
Todo este corredor feito picada era o mais percorrido, em viaturas, pelo Esquadrão sedeado no Tari, bem como a parte destacada na Vista Alegre a constituir também um ponto da importante rota.
Barbeiro improvisdo
Torna-se claro que o Grande Esquadrão a ocupar uma vasta zona, estava sempre em movimento, por tudo o que era picada, mesmo secundária, mas aquela era a mais directa ao Comando do Batalhão sito em Muxaluando.
Nas roças abandonadas, em virtude do terrorismo, de designações como Portugália, Quincuso e outras. As visitas só tinham a ver com a manutenção da soberania nacional, ao tempo tão propalada em todo o território.
Como um militar, fazendo parte de um grupo está sempre em guerra, nas quase diárias surtidas naquele corredor, sempre se passava pelo Lifune (Fazenda).
O Lifune fica logo no fim da descida, do que fora a grande povoação de Muxaluando e ao mesmo tempo centro comercial de certa importância, antes da actuação guerrilheira, do grupo denominado UPA, pelo que o Onofre e a estrutura do pelotão a que pertencia, estavam muito em acção e sempre a passar por ali, onde se cultivava um enorme palmeiral.
Imagem da Senhora de Fáttima recapturada
e colocado num nicho feito a propósito
A grande plantação originava uma fábrica em laboração quase contínua, na produção de óleo de palma. A única que se podia encontrar naquelas latitudes.
Porém, o que mais entusiasmos atraía nos militares, era a Dolores, uma preta nova e bonita, que sempre se deixava ver.
Refira-se a circunstância da raridade que representava, naquelas paragens, uma visão feminina. No entanto sabia-se da sua união conjugal ao chefe da laboração da fazenda.
Uma das atribuições que cabia aos militares, era o de também escoltar trabalhadores na safra do café, abundante e de grande qualidade na região, em fazendas que iam laborando, mesmo que os fazendeiros tivessem tido de abandonar as roças e procurar refúgio junto dos aquartelamentos, improvisados para efectivar a defesa de todos os bens da comunidade.
O rio Lifune também tinha a sua utilidade para a pesca dos lagostins. Ali se ia colocando armadilhas para os captar, só Oficiais e Sargentos eram beneficiários do produto.
Para essa actividade, como para todas as efectuadas fora do arame farpado a rodear as instalações, sempre tinha de haver um serviço de escolta.
No Lifune Tari, além de existir um rebanho de cabras, que se possuía por compra à tropa substituída, foi criada uma exploração agrícola, cujos produtos produzidos serviam para abastecer o rancho.
Os soldados a colaborar na agricultura, faziam-no sempre devidamente armados. O Sargento que se encarregava do comando da exploração, depressa tomou o cognome de "Lavrador".
Coisas que também os rapazes, mesmo em guerra não se cansavam de inventar. No caso partindo do atribuído ao rei D. Dinis, monarca da primeira dinastia.
A vinte e nove de Julho, foi dia de outra integração:
- Pelas três da manhã, em escolta de protecção a um outro pelotão do Esquadrão a participar numa das muitas operações militares, incluindo incursões no denso matagal, com o objectivo de reduzir o terreno desfrutado a belo prazer pelos bandidos da mata.
Consumada a operação terrestre, enquanto os elementos de serviço, em grupo motorizado deixando, como acontecia regra geral, em sentido contrário.
Os soldados atacantes foram recolhidos a meio da manhã pela mesma força, numa via transversal situada num ponto pré-determinado.
Veio a saber-se terem sido feitas várias baixas.

Daniel Costa

sexta-feira, 9 de abril de 2010

AMOR NA GUERRA



GUIA LOPES CABANDA

A tropa do Tari adoptara um colono fazendeiro, a morar aí como defesa, serviu de guia naquela labiríntica vegetação onde, que não conhecesse o terreno, podia dar voltas sem se dar conta de estar sempre a caminhar para ponto de partida.
Numa operação deu-se a chegada a um local, a servir de esconderijo e habitação de elementos da UPA, tendo as suas sentinelas.
Dado o alerta, verificaram-se as fugas, foi apenas apanhado um rapaz de cerca de quinze anos.
Estava ferido e escapou à chacina, por intervenção oportuna do próprio Comandante do Esquadrão, a comandar a operação.
É que sendo os militares muito aguerridos, ao ouvir o jovem proferir alto e bom som: "UPA... UPA... UPA!...” A tropa estragou a minha vida!"... Um dos mancebos não se susteve e já levantava uma catana, afim de lhe cortar o pescoço!...
No mesmo dia, o médico do Esquadrão, o Alferes Azevedo Gomes, que dava mostras de humanidade, talvez para conseguir abstrair-se e desanuviar a mente, subiu ao torreão, que servia de vigia ininterrupta ao aquartelamento, onde Onofre cumpria as suas horas de serviço.
- Deu-se, entre ambos, o seguinte diálogo:
- Dr. Azevedo Gomes:
- "Passei um dia bastante preenchido, além do muito trabalho com alguns de vocês, que me têm aparecido, ainda tive de tratar o jovem prisioneiro".
Onofre :
- O Doutor aí podia aplicar determinado comprimido e ocasionar a morte.
A resposta indignada, não se fez esperar: "O médico é para tratar da cura e não da morte, mesmo de um inimigo capturado".
Deu-se também um facto, que à distância de décadas, ou por isso, é para rir:
- Ia o Onofre no Jeep com os seus companheiros, acompanhando o respectivo pelotão em serviço na picada que vai dar a Muxaluando.
Havia muitas e belas perdizes, por aqueles sítios e como o apontador da Breda, o Teodoro, era amador de caça na vida civil, ao ver uma dessas aves, dispondo apenas de metralhadora pesada, não se conteve, e zás!...
Tiro!...
Era uma curva muito acentuada, própria para a ocorrência de uma emboscada.
Antes de entrar nessa, transitava uma outra coluna em sentido oposto, pertencia ao esquadrão de Comando e Serviços, com o próprio Tenente-Coronel Costa Gomes, nas suas próprias funções de comandante.
Tanto bastou para a segunda força abrir fogo, como lhe competia, visto que entendeu estar a sofrer um ataque.
Felizmente, não passou de uma “brincadeira”, ali pouco original, que podia ter o seu fatalismo, até no aspecto disciplinar, que não funcionou, talvez porque não foi investigada a verdadeira origem do episódio.
Na Segunda-Feira, nove de Julho, depois de ser escoltada uma missão. Na volta de regresso, constatou-se a apreensão de alguns canhângulos.
Para que pudessem efectuar a fuga, os terroristas, foram obrigados a abandoná-los.
A partir desse mesmo mês de Julho, o Esquadrão iniciou grandes obras da sua base do Lifune-Tari, sendo que a referência Lifune se deve ao rio do mesmo nome, que passa junto.
Tari - depois das obras

A metamorfose, que acabou por ser efectivada, ficou a dever-se aos escombros, resultantes da destruição da nova povoação de Quimanoche, onde residiam colonos.
Foi dali que saíram em várias colunas militares, todos os materiais de construção, nomeadamente madeiras, para construir vários edifícios, como mais duas casernas, para que cada pelotão tivesse a sua e com mais algum conforto.
Ficava patente o grande poder organizativo do comandante do Esquadrão, Capitão Alves Ribeiro e também do valor demonstrado, por vários militares oriundos da construção civil, cujo trabalho apresentado mostrou grande perícia.
Das várias idas, um dia em duplicado, do pelotão a que pertencia o Onofre, deu para verificar que se tratava duma povoação fundada recentemente, mesmo completamente destruída, sentia-se a solidez dos materiais utilizados e uma razoável grandeza, que o terrorismo acabara por aniquilar.
Entretanto continuava a registar-se um grande movimento de operações militares, que se denominavam batidas, visto que eram levadas a cabo com incursões no denso capim, a rodear a imensa floresta, servindo de protecção aos grupos de "turras", como eram apelidados em simplificação.
Numa dessas acções, a dois de Julho, depois de uma actuação, a que se poderia chamar de psico-social, foi uma árvore, uma garrafa protegendo uma mensagem.
Convidava todos os que viviam na clandestinidade a entregarem-se.
Resultou a recolha de um elemento, que se viria a tornar precioso como guia, dado ter relevo e conhecimento da zona.
Na mesma operação, foram ainda apanhados documentos que se revelariam importantes.
Dizia-se que a população colonial ao redor não sofrera os conhecidos e horríveis massacres que haviam chegado à Fazenda Maria Fernanda, onde estava instalado outro Esquadrão do Batalhão 350, porque o pai, não concordando com a operação nos moldes apresentados, retardou a respectiva informação.
O homem começou por ter uma guarda de dois militares, passando apenas a um, para depois ser como ser como mais um militar, na posição de guia, com direito a ir integrado nas operações, armado com espingarda Mauser.
Lopes Cabanda

Era o Lopes Cabanda, que realmente se tornou elemento incontestado guiando os militares pela mata, na prevista intenção de pacificar a zona onde fora desencadeada a guerra no Norte de Angola.
A tropa do Tari ia assim desenvolvendo grande actividade operacional, enquanto se iam vivendo tempos de pura abstracção com envolvimento na criação de factos divertidos, como a de "roubar" o maior número de quicos possíveis.
Chegou ao ponto de serem criadas estratégias interessantes, como aquela que o Belo um dia levou à prática.
Uma dessas peças regulamentares foi presa a um alfinete seguro num cordel. O contentamento gerado no suposto achador desvanecia-se abruptamente quando se apercebia ter caído numa armadilha.
Refira-se os designados quicos, eram coberturas de cabeça, que faziam parte do fardamento, a usar em momentos de lazer.
Eram muito leves e caracterizados por possuírem duas bandas, pendentes sobre o pescoço, fazendo lembrar novas orelhas.

Daniel Costa

terça-feira, 6 de abril de 2010

AMOR NA GUERRA

VISTA ALEGRE

Chegados à Fazenda Vista Alegre, a substituir o pelotão ali instalado, local donde partiu a tropa do Tenente-Coronel Maçanita, no ataque final ao bastião dos terroristas da UPA, agrupados na povoação de Nambuangongo, retomada alguns tempos antes.
A troca dera-se de imediato, uma vez que os militares pertencentes ao mesmo Esquadrão, já estavam bastante rodados nos movimentos a efectuar no cenário.
O serviço de escoltas continuou.
A partir daquele destacamento, saia-se muito para o Tari e Muxaluando, os corredores mais vigiados pelos militares daquela posição. Eram visitadas, em reconhecimento as roças vizinhas, onde só se encontrava destruição.
Amoço em Vista Alegre
As muitas visitas que se faziam ao Tari, onde estava instalado o comando do Esquadrão, eram sempre em missão de escolta, a par de trazer a área sempre debaixo de protecção.
Visavam o abastecimento, mas sempre na mente de todos os elementos, o correio e os frescos que a avioneta devia trazer duas vezes por semana, para dar o tão simples como o esperado conforto aos militares.
No entanto, continuava a passagem a ser muitas vezes miragem, tantas quantas as bastantes falhas.
No Domingo 10 de Junho de 1962, numa operação levada a cabo por tropa do Tari, deu-se a primeira baixa do Esquadrão.
A bandeira estava içada a meia haste e reinava a tristeza naquele aquartelamento.
Aconteceu num reconhecimento feito a um local, que a aviação bombardeara na véspera além da baixa, houve ainda quatro feridos, que acabaram por ser evacuados, de avioneta, para o Hospital Militar de Luanda.
O Onofre havia já travado conhecimento com um dos evacuados, numa efémera passagem pelo Hospital Militar de Elvas. A sua baixa à unidade hospitalar, teria o fito de livrar-se da vida militar e consequentemente da ida para o Ultramar, por ser oriundo de família abastada que tudo podia pagar.
Na circunstância pôde ler-se a notícia da sua morte, num jornal luandense. Pensara-se, por via disso, nunca saiu mesmo da cabeça de Onofre que a local poderia objectivamente ser forjada, visto jamais se dar o regresso daquele elemento ao Esquadrão.
A vida nas instalações improvisadas da Fazenda Vista Alegre, com o optimismo do Onofre, era agradável e o jogo de cartas continuava uma constante dos tempos livres.
Tornara-se uma actividade rentável. Pertencendo o Picão também ao pelotão destacado, continuava a ser o providencial parceiro.
Determinado furriel, que também pertencia ao pelotão e era civilmente bastante rico, logo de manhã fazia a sua abordagem para o jogo da sueca.
Como era evidente, perdia todos os dias.
Naquele aquartelamento fora passada a primeira quadra dos Santos Populares em Angola. Foi comemorada ali, com as tradicionais e festivas fogueiras.
No destacamento, além dos serviços de escoltas, inevitavelmente, estava presente a vigilância, dela dependia a relativa tranquilidade que se ia usufruindo.
Grupo descasca batatas a cozinhar para a refeição
Foi mesmo nesse dia, já em nova missão no corredor Tari - Vista Alegre, no célebre "bate e foge" daqueles tempos, que o Onofre e companheiros, sentiram a flagelação de uns tiros sem importância, mais para lembrar o estar-se ali a enfrentar uma guerra.
Estava a entrar-se numa fase de mais maturidade e muita actividade, naquela zona caracterizada por densa vegetação, grandes árvores e muitas plantações de cafeeiros.
Bananeiras, uma planta a poder ser considerada endémica, havia-as de várias qualidades e toda a gente tinha o seu próprio fornecimento dessa fruta, colhida numa das inúmeras sanzalas e roças abandonadas.
Abastecimento de bananas

Ao contrário os ananases, frutos que por vezes se encontravam nas mesmas circunstâncias, tornavam-se mais apetecíveis, mas não se reproduziam espontaneamente, como a bananeira, impossível de aprovisionar assim individualmente.

Daniel Costa

sábado, 3 de abril de 2010

AMOR NA GUERRA

EM NAMBUANGONGO

Até 1961, Portugal era potência administrativa de variados territórios coloniais, um pouco por todo o mundo, fruto das vastas viagens feitas por terras desconhecidas, até então, pela gesta lusitana de 1500.
Nesse ano deu-se o início do desmoronamento do mesmo. Uma escaramuça iniciada nos subúrbios de Luanda, que logo se estendeu ao Norte de Angola, foi a causa próxima.
Onofre, dito comandante de esquadra, mais os dois soldados do mesmo núcleo, Teodoro e Esquim Pinto, integrando o motorista Gastão, num Jeep propositadamente blindado e com metralhadora Breda montada, que lhes havia sido distribuído, pertenciam ao Esquadrão que substituíra no Tari-Lifune, uma das Companhias do célebre Batalhão 96, que havia reconquistado a vila de Nambuangongo.
A missão de Onofre e camaradas, com essa dissuasora arma, era o serviço de escoltas.
Foi assim que, logo nos primeiros meses de 1962, Onofre estava na vila de Nambuangongo, para onde tinha viajado em apoio ao pelotão a que pertencia.
Havia sido formada uma coluna de abastecimento.
Era naquele local, que se centrava o Comando do Sector Militar que actuava na zona.
Nambuangongo era uma das regiões onde, em 1961, havia sido lançada, a rebelião que haveria de se estender ao mundo ultramarino até 25 de Abril de 1974 data em que se deu a célebre Revolução, tornando possível a democracia no País.
A povoação era composta por uma igreja. A ladeá-la um cemitério todo cimentado, onde ficaram a repousar os militares mortos em combate na zona.
Capela da vila de Nambuangongo,reconstruída por militares,
em 1961, após a retoma do bastião da UPA
Cemitério militar de Nambuangongo, onde ficaram
 a repousaar os mortos em combate

Muita tropa passou por ali, desde praças a oficiais superiores, em missões de comando, formavam uma comunidade a tornar aliciante a visita de gente cheia de vida como o observador Onofre.
Para começar, o abastecimento demorava quase todo o dia, preenchido pela classe das praças na procura de conterrâneos, o que proporcionava inesperados encontros.
Nas cantinas militares eram lembrados episódios pitorescos, muito naturais numa mocidade fogosa.
Placa de homenagem aos mortos do Batalhão 96
que retomou Nambuangongo
Ali era uma das sedes do teatro terrorista, em virtude de tais circunstâncias verificara-se um êxodo total de residentes, incluindo já se vê o elemento feminino, a ponto de a a zona ser um exclusivo de homens fardados servindo o exército,
Na verdade, muitas incidências valiam exacerbadas recordações. Normalmente metiam namoradas ou outras aventuras vividas.
As cantinas eram os únicos pontos de encontro dos circunstantes, em serviço, que mais não tinham a fazer senão a escolta de volta. Então era à roda das "Cucas" que se processava todo o tipo de conversas, até que vinham à baila as localizadas naquele espaço e no próprio tempo que ali se vivia.
Onde há muita gente, existe sempre infinita matéria factual a abordar.
Os circunstantes sempre iguais na aparência, porque fardados pertenciam a classes mais baixas. Vários oficiais superiores, até por mais velhos, serviam os muitos motivos de interesse anedótico aos olhos da juventude.
Havia um Tenente-Coronel que já se celebrizara pela denominação de "Totobola".
Em operações militares, comandava os seus efectivos, viajando em avião, proferindo incentivos como o de ter sido grande desportista do volante e entre outros, o de ter conquistado grande número de mulheres.
Outro comandante dum Batalhão estacionado ali, num monte imediatamente a norte, todas as manhãs vinha à localidade às cambalhotas, fazendo uso da pistola, num tipo de preparação física, era o alvo das maiores chacotas.
Depois das obrigações militares tornava-se obrigatório, falar sem qualquer cerimónia de certos oficiais superiores.
Não deixava de ser curial, pois já o próprio Montegomery, figura muito conhecida da Segunda Grande Guerra, como a raposa do deserto, tinha pouco apreço por elevadas patentes, embora pertencendo a essa alta classe militar.
Naquela primeira cavaqueira, entre muitos assuntos, surgiu aquela de os terroristas terem atacado a cozinha. Da escaramuça não resultaram mortos ou feridos, pelo que a boa disposição não arrefeceu. Só os grandes tachos haviam sido furados pelas cargas dos canhângulos dos adversários.
De volta nos cerca de trinta quilómetros, que era necessário percorrer, metidos naquela fortaleza em estradas de terra batida, muitas peripécias havia a comentar, como a do Esquim Pinto que, tendo possuído uma oficina de bicicletas, encontrava amigos como ninguém:
- Dizia ele:
- Em Nanbuangongo há grandes camaradas!
- O Teodoro retoquiu: Pudera!...
Passámos todo o tempo no meio das "Cucas", onde havia sempre alguém a pagar para nós!
Outra do Esquim Pinto, inveterado fumador:
- Agora só fumo C.T. (era considerado o melhor tabaco), mas só se for dado!
Viagens em escolta eram quase diárias. Tudo levado em jeito de divertimento e passatempo lúdico, não excluindo os perigos que podiam vir das matas.
No acampamento do Tari, o Onofre reflectia muito, uma forma de ser e estar, embora em contraste com a situação de guerrilha, dava para se sentir bem, apesar de tudo a sua existência era melhor do que a passada, assim como a futura jamais seria tão sofrida.
O optimismo iria manter-se em alta, durante os vinte e sete meses seguintes, que culminaram com o fim da comissão.

Fotos: arquivo de Daniel Costa
Daniel Costa