CASAL DO FOZ A TERCEIRA LENDA

Sem duvida, o Brasil é o País do futuro. Há apenas, de não se adiar esse futuro.

terça-feira, 23 de março de 2010

AMOR NA GUERRA

REGIÃO DOS DEMBOS

Uma coluna militar composta por Jepps e Unimogs a estrear, adaptados com blindagens de aço, preparados para a missão de guerrilha, enquanto se ia esperando a localização da área a ocupar.
Esta situou-se na Região dos Dembos.
Terminado o tempo de estágio, chegou a ordem de avanço, com viagem e tomada de posição na Fazenda Lifune-Tari, a cerca de duzentos quilómetros a norte de Luanda.
Saídos naquela madrugada de Março, a breve trecho, todo o Batalhão de Cavalaria 350, se tinha embrenhado na viagem. Logo a sua estrutura foi assumindo, pouco a pouco outra postura. O ambiente já se ia tornando florestaL, o novo habitat das tropas que iam combater.
O cenário que se apresentava era o da esperada guerrilha.
Pouco depois da saída, passou a ser facto estar desbravado o capim e toda a flora em cerca de uma dúzia de metros, dos ambos os lados da estrada, de terra batida, ao longo de toda a extensão, não só tendente a que a visibilidade fosse um facto.
Ainda para obviar a um ataque traiçoeiro dos bandidos da mata, como eram definidos os terroristas, caindo em cima da tropa, avistados apenas quando já seria impossível um contra ataque, sem que tivessem caído uns quantos militares apanhados pela surpresa.
Um dos grandes trunfos de todas as guerras.
Integrado o Esquadrão, o Onofre ousava seguir sempre descontraído, como lhe era muito natural, o que não excluía a grande atenção patenteada em todas as acções da sua incumbência.
Uma pausa na viagem

Chegados à primeira instalação de tropas, uma fazenda chamada Balacende, logo aí houve conhecimento de ter havido, dias antes apenas, como sempre, um verdadeiro ataque terrorista cobarde.
Veio a verificar-se ser o último do género.
Consistiu no seguinte:
- Uma horda de terroristas, armados apenas com catanas e canhângulos, armas rudimentares, com que uma facção indígena havia iniciado aquele tipo de ataques, vociferando no assalto à mistura com imprecações como:
- A bala do branco é água... não mata!...
Evidentemente que, da surpresa resultou a queda de vários militares. A partir daí é previsível, o que aconteceu, dava a ideia que os atacantes tinham sido criminosamente drogados, acabando todos por cair à força do poder de fogo das tropas regulares, ali estacionadas, prontas para a defesa militar de toda a zona.
Ali verdadeiramente, os militares do Esquadrão, começaram a sentir os perigos que lhe estavam destinados.
A grande aventura sempre prevista pelo Onofre, já se estava a concretizar.
De emoção em emoção, ainda no dia 5 de Março de 1962, apenas percorridas algumas dezenas de quilómetros, os novíssimos carros da coluna começavam a avariar com frequência.
Indiciava-se a pouca experiência dos condutores. De uma maneira geral, só levavam na bagagem aprendizagem militar de três a quatro meses e transitavam por caminhos de terra batida, designados de estradas, mas impróprios para condução, ainda que os carros utilizados já fossem de fabrico adaptado ao terreno.
A cada interrupção, a lógica obrigava a formar-se guarda ao dispositivo militar em deslocação.
Numa dessas ocasiões, com numa verdadeira temperatura africana, já de noite, esgotados os cantis, de novo chegou a sede. Foi altura da tropa conhecer providencialmente uma árvore frondosa, existente ali naquele clima, dir-se-ia microclima, deitando pingos de um líquido muito fresquinho, que serviu de atenuante à irresistível vontade de refrescar as gargantas.
Embora mais vezes se viesse a sentir a necessidade daquele milagroso néctar, nunca mais seria detectado.
Ainda na mesma noite, depois de passado o dia com recurso à alimentação de reserva, bolachas de água e sal e umas latinhas de variados produtos, deu-se a chegada a um outro ponto operacional militar, designado por Beira Baixa, foi aí que se pernoitou. No caso do Onofre e seus e companheiros mais próximos o Jeep serviu de cama.
Como tudo o que indiciava aprendizagem para a nova missão era motivo de atenta observação. Para trabalhar na fazenda logo de manhã cedo, um grupo de Bailundos formou, afim de se proceder à habitual chamada imposta pelos tempos de guerra.
Pela primeira vez era dado ao Esquadrão ver tantos negros juntos. Depois já perto da "picada" de saída, encontrava-se uma casota, servia de cadeia a terroristas, porventura, apanhados. Ostentava a pomposa inscrição de palácio da justiça. Muito perto uma tábua em jeito de seta, apontada para Lisboa, indicava a distância respectiva em quilómetros.
A casota onde se prendiam adversários capturados.
 Na parte superior a inscrição palácio da independência

Com passagem no cruzamento de Nambuangongo, depois pela fazenda Onzo, outra posição militar, chegou-se cedo a Muxaluando onde ia ficar o comando do Batalhão.
A alimentação continuou baseada na habitual ração de reserva.
Estávamos no dia de Carnaval de 1962.
Naquele dia, ali se fez a dormida, sobre um cartão, com o bonito firmamento a servir de cobertura.
Mas a vida aventurosa não deixaria de continuar.
Chegados ao aquartelamento, ainda fora do recinto de arame farpado, que ladeava o perímetro do mesmo, constituindo uma primeira defesa, enquanto os militares esperavam a ordem de se instalarem, o Picão combinou uma banca de jogo da sueca.
Debaixo de um Unimog, num jogo circunstancialmente demorado o Onofre, de parceria com o organizador, chegaram a um resultado deveras positivo, naquela actividade a que continuava a chamar lúdica, embora movimentasse largos Angolares.
Valeram as amizades já constituídas terem, entretanto, tratado da instalação em ponto agradável nas ruínas do edifício, a que se chamou de caserna, como tinha de ser óbvio, não obstante a sua degradação, em virtude da acção do recente início de guerra.
Depois de demorar três dias a percorrer os cerca de duzentos quilómetros, que distavam de Luanda, no dia sete de Março o Esquadrão instalara-se finalmente na Fazenda Tari-Lifune, onde iria ficar sedeada.
Da ementa do almoço daquele dia voltou a constar ração de reserva.
Já havendo as barras das camas, para servir de colchões, havia folhas de zinco. Para almofadas, os militares usaram feixes de capim.
Não havia ainda qualquer roupa de cama.
A lógica do dito, "desenrasca-te que és de cavalaria" - talvez nunca tenha tido tanto sentido de oportunidade!

Fotos e texto de Daniel Costa



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